quarta-feira, 19 de outubro de 2011

MANIFESTO


Quando eu nasci, entregaram-me um kit de sobrevivência
Nele tinha uma máscara e um manual de instruções
instruindo-me sempre a andar na linha, que me parecia tão reta,
a obedecer sempre, a me calar e acreditar em tudo que eles falavam

Rasguei o manual e fiz uma fogueira na praia para tocar meu violão
Das placas que me ensinavam a não me perder, arranquei todas do chão
Mais lenha para minha fogueira
E foi ali que acendi a chama de meu coração

Quanto tempo será preciso para percebermos que não é preciso a precisão?
Tudo que eu preciso é de uma alma leve e pura
O improviso puro
Nada de previsões

Quero o novo aos meus olhos
Quero seus olhos em brasa,
como se a alma quisesse rasgar teu corpo, pedindo para sair
Quero quem também rasgou o manual de instruções
e jogou fora sua máscara

Se há um céu imenso e infinito...
por que temos que andar com os pés no chão?
Meus passos jamais serão o tic tac de um relógio
Que nunca para, mas sempre está nas mesmas posições
me dizendo a hora que devo acordar
a hora que devo dormir
a hora que tenho que trabalhar
e, se brincar, até a hora que devo sorrir

Nunca mais dei corda em meu relógio
Perseguiram-me, falaram-me de uma tal subversão
Não me espanto...
Submersos em plena superfície,
os olhos só servem para não tropeçar
ou evitar um escorregão

Com meus olhos fechados, em pleno silêncio, vejo tudo tão claro
Dentro de nós está a resposta do que se busca lá fora
Descubro isso e cuspo tudo aqui e agora
Mas quem vai me ouvir, se os ouvidos só servem para ouvir a televisão,
se só servem para ouvir a mesma repetição?

Faço meu manifesto
Nem que seja só meu, mas meu
O alimento podre e vencido que empurram em sua cabeça
é tudo que o monstro invisível precisa para estar em forma
Seu sangue, meu amigo, é sugado e assim o Estado tem uma plena digestão 
Quando eu nasci, entregaram-me um kit de sobrevivência
Mas descobri que não era para minha vivência
E sim para manter vivo o estado

Estando todos calados, os poderosos não podem ser tocados
E aceitar tudo isso em troca de fome, vidas perdidas à toa, tanta coisa errada,
não está em meu manifesto
Toda essa sujeira me dá uma grande indigestão
Tenho nojo e vomito tudo aqui através de minhas palavras
E no final, eles é que me acusam:
eu que causo, para eles, uma imensa indigestão

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